domingo, 21 de agosto de 2011

Vain Attempts

Ela me olhou nos olhos e perguntou:

- Você já amou alguém?

E eu não consegui resistir, sorri. Não um sorriso amarelo, mas também não uma risada. Aquele tipo de sorriso quando um dos lados da boca está aberto e o outro não, um sorriso que, junto ao movimento da minha cabeça, a expressão no olhos, e o franzir das sobrancelhas, daria às pessoas que nos olhassem naquele momento que estávamos flertando. Não era uma completa mentira, mas também não era uma verdade. Ela tentava me provocar e eu certamente não deixaria de tentar provocá-la de volta, não é o tipo de chance que se tem todos os dias. Ou melhor, sim, se tem esse tipo de chance todos os dias, mas raramente elas são chances tão interessantes.

- Eu? Hahaha. Tudo que eu conheço é amor, já a muitos anos. Amor é a única coisa boa que sobrou dentro de mim depois de tanto tempo.

Ela sorriu de volta, de um jeito não menos provocante, embora de uma forma diferente. Os olhos dela tinham aquele brilho que destrói tudo que cruza pela frente. Era como se tivesse um segredo, como soubesse alguma coisa que eu não sabia, como se estivéssemos jogando uma partida de xadrez e eu tivesse feito exatamente o movimento que ela esperava que eu fizesse para me encurralar em um xeque-mate sem que eu percebesse.

- E você fala como se isso quisesse dizer alguma coisa. Como se tivesse respondido a minha pergunta.

Eu obviamente não tive reação alguma, estava muito perdido naqueles olhos – e não só nos olhos para ser completamente sincero – para me importar com uma argumentação. E na verdade eu mesmo sabia que o que havia dito não queria dizer nada, sabia muito antes de falar, mas nunca, numa situação como aquela conseguiria deixar de falar uma frase de efeito. Mas a verdade é que se tivesse pensado antes de falar, como não costumo fazer, teria falado algo bem parecido. Acreditava piamente nos meus amores, e acreditava na minha capacidade de mantê-los, não ia deixar isso de lado por um flerte, alguns sorrisos sugestivos e alguns olhares, por mais que fossem o tipo de sorriso e olhares que mais me interessavam.

Com o meu silêncio, continuamos trocando olhares, e ela continuou:

- Na verdade, se isso me responde alguma coisa, é exatamente que você nunca amou. – Foi isso que me espantou. Instantaneamente mudei de posição na cadeira, sabia que a minha expressão tinha me traído, desviei o olhar, apenas por alguns segundos perdi o contato com os olhos dela e vi o vapor que subia das xícaras. Devo ter ficado vermelho, no momento em que olhei de novo para ela a expressão não tinha mudado muito, continuava segura e orgulhosa, havia encurralado meu rei com uma afirmação que não era verdadeira, não para mim. E continuou. – Levando mais a fundo… Me atrevo a dizer que você nunca conseguiu amar ninguém, e duvido que conseguiria fazer isso hoje.

- E por que você acha uma coisa dessas? Meu coração pode se apaixonar por qualquer coisa, a qualquer momento, sem o menor controle da minha parte. Mas por que tão preocupada com isso? Quer ter certeza que eu vou me apaixonar por você? – Consegui voltar à expressão inicial, não era difícil se perder nela.

Ela riu, uma risada clara, limpa, que não poderia significar nada de ruim.

- Não, seu coração não conseguiria. E sorte a sua que não estou interessa em uma paixão, apenas sexo.

- Ah, mas a pergunta mais importante você não respondeu…

- Você gosta demais do amor, é poeta demais para já ter amado. Você já sabe muito bem das coisas que gosta, só encaixa o mundo nessas coisas e chama de amor.

- Oras, quem sou eu para saber do que preciso, e quem somos nós para saber o que é realmente o amor, ele pode muito bem ser isso que você acabou de falar que não é.

- Não tente escapar com jogos de palavras. Você pode não saber o que precisa, mas eu sei muito bem.

Foi uma noite divertida.

***

“Call in love, call in whatever you please
It's not what you wanted
It might be just what you need

[…]I don't know what it is I'm feelin'
A four letter word really gets my meaning
Nothing ever lasts
Forever” – Beady Eye.


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sábado, 20 de agosto de 2011

Try Again Tomorrow.

Você tenta mudar, mas não é fácil. Não dá para mudar aquilo que você é do dia para a noite, ou da noite para o dia. Você pode tomar decisões, você pode até mesmo tentar mudar algumas coisas fundamentais, pode deixar de se importar com as coisas que fingia se importar antes, pode simplesmente não olhar na cara daquelas pessoas que você não consegue mais suportar. Mas esse tipo de coisa não é suficiente, não vai te livrar de coisa alguma. Na verdade, nada vai te livrar do desconforto para o qual a vida vai sempre te empurrar. Mas as perspectivas para além da vida só são melhores se você for muito otimista. E, convenhamos, você não é, não precisa mentir para mim.

thats-life-z4zpsm3pb-85207-430-602A única chance que você pode ter de fazer isso com sucesso – e mesmo assim apenas por algum tempo – é deixando tudo para trás. Mas isso é fácil de imaginar, você já devia ter pensado nisso mesmo antes que eu falasse. Mas também é impossível olhar ao seu redor e não querer continuar se apegando a ao menos alguma coisa; pode ser um amigo, um lugar, uma mania. Ninguém realmente quer se livrar de tudo, mas algumas vezes parece ser mais vantajoso deixar de lado algumas coisas boas quando as ruins são consideravelmente mais significativas. Mas isso não é fácil, a perspectiva de deixar de lado todas as pequenas coisas que ainda te dão prazer para substituí-las por incertezas não é das melhores. Você sabe que a tentação para voltar atrás vai ser grande, e que a única forma que existe de não ter como voltar atrás é muito definitiva, e nem um pouco segura. Então por que não optar pelo caminho mais simples e ir mudando aos poucos, não é mesmo? Só que essas mudanças lentas nunca são mudanças de verdade; quando você começar a ignorar as coisas que merecem ser ignoradas, quando começar a fazer as coisas que sempre quis fazer, vai ter que se preocupar em encaixar o horário da sua vida anterior, vai tentar ser educado quando perguntarem o por que você está tão diferente, por que não anda mais com algumas pessoas, por que sempre que tem tempo livre se afunda num livro qualquer sem a menor pausa para jogar conversa fora. E você não vai dizer que é porque despreza as pessoas ao seu redor, que as conversas que tinha com elas não te dizem nada e que preferia não estar ali, mas que não largou aquilo por um pequeno detalhe que não importa o quão bem você consiga explicar, ninguém nunca vai conseguir entender.

Mas, é claro, existe a possibilidade de você ser um verdadeiro espirito livre e deixar completamente de lado essas malditas convenções sociais. Isso vai fazer com que se sinta melhor, funciona para mim. Mas não importa. A sensação de vazio vai voltar; você vai voltar a perceber que nada daquilo tem significado para você, exceto um ou outro pequeno detalhe. E você vai tentar de novo, e se enganar de novo. Mas essa é a vida, as pessoas não são peças de um quebra-cabeças, as coisas não vão melhorar em algum momento, não vão surgir significados, paixões novas não vão curar as feridas antigas, aquelas três coisinhas que são tudo para você não vão te salvar. Ignorância e inocência vão te proteger, mas não vão mudar o mundo, e, depois de perdidas nunca podem ser recuperadas.

Viver deve ser aprender lidar, sem nunca conseguir, sem nunca se resignar, pois resignação é morte, e a morte não é nada se não a continuidade eterna daquilo do que por uma vida inteira você tentou fugir. E morrendo você não pode dizer nem mesmo que foi teimoso o suficiente para continuar tentando aprender até conseguir.


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sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Necessidade desnecessária (Ou I Want You)

O Corvo do Poe olhou para mim e disse: “Nevermore”.
***35771-1c62df-530-668
É difícil argumentar. É difícil tentar explicar. Mesmo uma pessoa que vê significado em tudo vem, olha e vê que não existe nada, é vazio. Não existem motivos, apenas desculpas para suprir as lacunas que, no fundo, não podem sequer ser realmente sentidas, pois não estão lá. Tento sem sucesso me convencer que é só um engano, que estou errado, que não tem como ou porque. O buraco no chão continua apenas meio preenchido, não importando quanta terra se jogue em cima do cadáver, chegando ao ponto de nem sequer se ter certeza se ainda existe alguma coisa sob aquelas pás de terra, se existe alguma coisa no fundo, alguma coisa ainda que morta, ou se tudo não passa de desculpas criadas por uma mente que não consegue encontrar nada que realmente sirva como seu lugar de descanso, como um remédio para as inquietações que sempre teve, mas não quer ter por outra eternidade. Por isso se utiliza de um placebo para os espíritos inquietos, e quando percebe o que está fazendo, deixa com que o buraco que tenta tapar simplesmente cresça e fique mais fundo. Falta a coragem para pular na tumba e se sujar de lama, procurando algo que pode muito bem não estar lá. Não, a coragem não falta, ela simplesmente não existe, como tudo o mais, não existe nem mesmo a fraqueza. E quando percebo isso me desespero. Não existe nada que possa fazer, não existe nada, não existe a mínima chance de criar alguma forma de sair dessa situação, pois não existem lugares para onde ir, e mesmo as ideias não podem ser moldadas para fornecer algum conforto. O desespero faz perceber que também não existe ideia nenhuma, que tudo aquilo no que acredito – aquela pá, aquela terra, e a possibilidade de existir algo abaixo dela – tudo não passa de uma ficção criada para que não me sinta assim o tempo todo. Se as lágrimas ainda existissem dentro de mim, elas viriam, mas nem isso. Tento me convencer que não preciso mais dessas ficções, que não tenho mais utilidade para essas máscaras, que não tenho motivos para não me conformar com a minha existência inútil, sem sentido, praticamente uma não existência.
Tento me convencer que não preciso de desculpas, de como ou porquê, mas não consigo, me perco e me deixo, mas não consigo fingir que sou alguma coisa, fingir que não preciso dessas mentiras para me sentir como humano.
Tento me convencer – mas não consigo – de que não preciso de você.
***
“I couldn't make a sentence,
I couldn't even say what I meant to say.
That I want you;
it doesn't hurt to say I want you.
I need you;
I never thought I'd say I need you.
I'll keep you,
Oh yes I'll keep you and I'll throw myself away.
And I'll break you;
because I lose myself inside you.
I'll make you fit in the space that I provide you.
I'll take you,
Oh yes I'll take you just to push you far away, away, away.”
- Pulp, I Want You.
***

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